O Coletivo Nacional de Lésbicas Negras Feministas Autônomas – CANDACES BR, tem como diretriz principal a visibilidade, letramento e empoderamento das lésbicas negras sendo destituído de preconceitos e discriminação de qualquer natureza (racismo, sexismo, lesbofobia, discriminação racial e todas as discriminações correlatas). Compondo-se de um espaço para o exercício da solidariedade e construção dos conceitos de promoção de Cidadania e Direitos das Lésbicas Negras, no desenvolvimento da consciência crítica visando autonomia e transformação do indivíduo para que este se torne agente transformador em nossa sociedade.

O Coletivo Candaces tem como finalidade a luta pelo estabelecimento de uma política eficiente de saúde publica ligada a feminização da AIDS, através do Plano Integrado de Enfrentamento à Feminização da Epidemia da AIDS e outras DST, bem como desenvolver projetos voltados para a promoção da cultura, educação ambiental, comunicação, arte e gênero.

O Candaces também traz a preocupação e o recorte das pessoas com deficiência, nesse caso em específico as lésbicas e bissexuais, com algum tipo de deficiência. Para a garantia das especificidades no contexto geral das Políticas Públicas, no reconhecimento enquanto sujeitos políticos da história. Não são privilégios, mas sim uma atenção diferenciada dentro da política de saúde nacional, respeitando sempre as condições e limitações das pessoas com deficiência. Nesse sentido torna-se de suma importância que o segmento das pessoas com deficiência seja consultado na elaboração de novas propostas de Políticas Públicas visando sempre à acessibilidade e a inclusão social para todos.

domingo, 23 de março de 2008

As Lésbicas Negras e o Movimento LGBTT.






As conquistas e as garantias do povo negro são obrigações de toda a sociedade brasileira. Estes direitos de fato, são direitos humanos, pois à comunidade negra foi negada historicamente até os mais elementares Direitos Humanos, como o direito a vida, alimentação, saúde, trabalho, educação; contudo, Direitos Humanos não e tornam realidade a partir de políticas públicas adotadas pelo Governo e da Organização e participação da sociedade [1].
No Brasil uma das principais tarefas da luta anti-racista é a desconstituição do “mito da democracia racial”, ideologia que tem como objetivo ocultar a segregação e a violência promovida pelo racismo da sociedade brasileira.
Com o avanço das lutas do movimento negro e do movimento de mulheres negras a negação frontal do racismo é paulatinamente substituída por solenes declarações que reconhecem os problemas, mas indagam o papel dos indivíduos, das instituições e do Estado na sua superação. A naturalização das desigualdades raciais é agora substituída pela naturalização do racismo, que isenta a sociedade de responsabilidade e termina por culpabilizar o próprio negro pelos privilégios raciais, materiais e simbólicos da elite branca masculina.
A opressão sofrida pela mulher negra na atualidade é de natureza econômica, histórica e social.
Com a assinatura da lei Áurea, o negro é arrancado da sua terra que havia cultivado por mais de 300 anos e jogado sem nenhuma preparação para a periferia urbana sem as mínimas condições de sobrevivência com a farsa da abolição e da passagem da produção doméstica e agrícola para a mercantil industrial, a inserção da mulher negra na força de trabalho sofre algumas alterações. Na vigência do sistema escravagista ela desempenhou juntamente com o homem negro, atividades econômicas fundamentais para a produção. Já no capitalismo com a utilização da tecnologia em larga escala a maior parcela da força de trabalho da mulher negra só encontra saída na função de doméstica porque só são necessárias á produção as mulheres “tecnicamente adestradas”. Desta forma, à medida que empurra o homem negro á marginalização, o modo – de - produção capitalista responsabiliza a mulher negra pela manutenção da família.
Com toda esta construção social a população negra não foge a regra da constituição de um Estado não laico, onde tradição e família são suas bases estruturantes da cultura, mesmo com a cultura da oralidade de preservação ancestral do povo negro. Esta base estrutural em um todo introduziu o preconceito no mais alto índice de exclusão racial, bem como também invisibilizou as questões das diversidades e das identidades na comunidade negra.
O segmento da livre orientação sexual tornou-se um tabu nas relações internas da comunidade negra, que como todas as raças têm sua diversidade sexual, mas pelo machismo construído também para a cultura do homem negro, denominado: garanhão, bom de cama e para as mulheres negras amas secas, domésticas ou sensuais da cor do pecado, fez com que o movimento negro na sua organicidade e na urgência da quebra do racismo institucionalizado na sociedade brasileira não admitisse a possibilidade do debate de suas diversidades internas, entre elas a questão da homossexualidade negra, ocultando assim nas suas reivindicações por ações afirmativas, bem como de políticas públicas, o direito dos homossexuais negros expressarem suas demandas enquanto triplamente discriminados nesta mesma luta contra o racismo e todas as formas de preconceitos, pois esta parcela da comunidade negra diariamente são submetidas e expostas à violência promovida pelo racismo, sexismo e homofobia da sociedade branca, por esta ocultação do movimento negro nesta questão específica, fez com que no interior do mesmo a comunidade homossexual negra seja vista como debilitante, um ultraje á ordem social estabelecida e á imagem do homem negro que é tido como símbolo de masculinidade [2].
Com todos estes fatores de negação da diversidade sexual, muitos gueis e lésbicas, optaram em negar-ocultar sua orientação sexual pela centralidade imposta pelo movimento negro, que é a luta contra o racismo e assim tornaram-se lideranças muitas vezes coniventes com a homofobia internalizada e externalizada por muitos ativistas do movimento negro até hoje, passando assim a ser aceito enquanto lideranças valorosas, combativas nas lutas - sem dúvida nenhuma urgentes para os objetivos traçados pelo povo negro por uma sociedade sem racismo - e passiva enquanto as questões de sua própria identidade sexual, deixando a mercê toda uma parcela do segmento homossexual negro nas formulações de políticas públicas para a comunidade LGBT, dirigida em toda sua maioria por brancos de classe média, onde as (os) negras (os) homossexuais que destacam se neste movimento não possuem nenhuma identidade nítida de sua negritude, fazendo o discurso “chapa branca”, para aqueles que também os oprimem por terem sido educados para dar continuidade à sociedade eurocêntrica, sem notarem que estão sendo usados como massa de manobra para novos financiamentos, tornando-se assim o (a) negrinha (o) porta vozes de toda uma subjetividade malévola do uso perspicaz da necessidade da auto - estima que esta (e) lésbica – guei necessita por enfrentar diariamente o racismo e a homofobia e não encontrando em seu Ketu, aceita este papel deliberado pelas lideranças brancas do movimento LGBTT, não por que elas querem, mas por que necessitam nos dias de hoje para o discurso do recorte racial.
O mito da Igualdade racial e a ideologia do branqueamento, criado pelo liberalismo paternalista que a esquerda diz combater refletem-se nos mais diversos movimentos como, por exemplo, o de Mulheres e LGBTT, onde assumem a atitude “democrática” que nega a questão racial, diluído-a na luta de classes [3].
Podemos interpretar desta perspectiva, que sexismo, racismo e orientação sexual seriam variações de um mesmo tema mais geral que tem nas diferenças biológicas (reais ou imaginárias) o ponto de partida para o estabelecimento de ideologias da dominação [4].
O esquecimento da questão racial pode ser interpretado como um caso de racismo por omissão, que se origina de perspectivas eurocêntricas e neo colonialistas da realidade Latino Americana, portanto uma forma de eurocentrismo que ao descartar, ou pelo menos subestimar as dimensões índia e negra na construção das Américas, comprometendo a realidade do feminismo e do movimento LGBTT Latino Americano [5].
Existem tanto feministas brancas e negras, bem como ativistas homossexuais brancos comprometidos com a questão racial, porém estes movimentos são movimentos de mulheres e homossexuais brancos! Isto porque no interior destes movimentos citados como exemplo, ainda existe o discurso estereotipado: as lésbicas e gueis negros são indóceis, agressivos, criadores de caso, difícil o diálogo com eles, etc. [6].
Na realidade a dificuldade do movimento negro e do movimento LGBTT é ambos reconhecerem as suas diversidades internas, no movimento negro a aceitação do debate direto e interno de aceitação e compreensão para com a homossexualidade negra e com o movimento lgbtt negro um aprofundado conhecimento da luta de combate ao racismo e as questões estruturantes que leva o todo do povo negro ser discriminado. O primeiro omite a existência LGBTT negra e o outro fala, define e classifica através de um sistema ideológico generalizado que reproduz o eurocentrismo cujos efeitos neocolonialistas são formas alienadas de uma teoria e de uma prática que se afirmam como libertárias [7].
Hoje, quando os homossexuais negros e negras buscam uma forma de se organizar enquanto cidadãs e cidadãos em busca de um debate no interior do movimento negro e de empoderamento no movimento LGBTT, ainda encontra inúmeras dificuldades de expressar para que surge, comentários de que enquanto negras e negros homossexuais estamos fragmentando ambos os movimentos e ignorando a luta do todo, por um lado a luta contra o racismo e pelo outro a luta contra a homofobia e lesbofobia. Ora, se os LGBTTS não se sentissem hostilizados, invisibilizados por ambos os movimentos não sentiriam a necessidade de organizarem-se, mas no decorrer das reivindicações por igualdade social, racial e de direitos pela livre orientação sexual, tanto ações afirmativas, tanto por políticas públicas para homossexuais negras e negros. A questão aqui colocada é complexa, pois não estamos tratando do racismo descarado e nem da homofobia e lesbofobia latente, tratamos aqui do racismo e da lesbofobia e homofobia invisível, tratamos aqui do sofrimento psicológico da negação dos homossexuais negras e negras da sua condição humana e de identidade, já que não é encontrada guarida de atenção aos seus anseios no seu ketu.
Já no plano de políticas públicas do Governo Federal, o plano Brasil sem Homofobia, visa atender as demandas do movimento LGBTT em esferas transversalisadas dos ministérios e secretarias, porém o que vemos são apenas capacitações para o discurso homossexual de conveniências para uns poucos visibilizados em sua maioria de Ongs dirigidas pela elite branca onde os homossexuais negros e negras encontram resistência em desenvolver sua auto - afirmação não só no recorte étnico racial, mas também enquanto agentes de controle social das demandas provocadas por este programa inserindo nesta perspectiva um jeito novo de gerenciarem suas demandas específicas; pensando nisto os homossexuais negros e negras organizam-se em redes onde estão aprendendo a desenvolver o diálogo a visibilidade e empoderamento de suas lideranças lincados no debate interiorizado no movimento negro para o movimento LGBTT. A reflexão aqui lançada é: para se tornar uma liderança negra lgbtt ou não, deve abdicar de seu senso crítico as propostas elaboradas por um grupo de lideranças não negras em relação a políticas públicas LGBTTS afro?
É através da juventude e do seu enfrentamento as resistências arcaicas de lideranças negras e LGBTTs, busca-se inserir uma nova forma de pensar e atuar que a questão das cotas para universitários, o debate da redução da maioridade penal , da reformulação dos currículos escolares, do controle da saúde negra, das matrizes africanas, pela implementação da lei 10639-03, e da aprovação do estatuto da igualdade racial, também são lutas dos homossexuais negras e negros, pois os mesmos são triplamente atingidos por estes preconceitos enraizados nesta sociedade branca brasileira.
Quando ativistas do movimento LGBT negros e negros, discursam que existe um racismo institucionalizado no movimento LGBTT em seu todo, são questionados (as) se possuem provas estatísticas, o argumento é que se racismo é crime deve ser denunciado, pois bem, o que está sendo denunciado não tem números, não têm estatísticas, pois a denúncia é do campo subjetivo do “mito da igualdade racial” enraizado na sociedade eurocêntrica brasileira, tenta-se com estes questionamentos coagir o debate para diluir-se na luta de classe e não de raça e classe; por isto a importância destas redes organizadas de LGBTT negras e negros; porém, este segmento e debate deve ter sua inserção e aceitação também no movimento negro para aí sim, serem verdadeiramente compreendidos e defendidos enquanto atores do movimento negro em um todo na sua luta pela igualdade racial e todas as formas de preconceito.

Leila Lopes

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